sexta-feira, 29 de novembro de 2013

poeira

Encontrei-o algum tempo depois
continuava aquele mesmo sujeito do último adeus:
um homem sério, incorrigível;
um racionalista irremediável
de visão humana infalível,
da inconfundível sobriedade exata
E, principalmente,
um homem de decisões inexoráveis.

Um semblante muito digno de um olhar severo
E de um robusto e previsível bigode.

Mirou-me de longe como quem mira uma borboleta,
Indiferente ao inseto inútil
Mesmo que nele reconhecesse alguma beleza frívola.

E eu gozando ao voo livre
Sem orgulho e sem dignidade
Ia borboleta de tamanha ingenuidade
Que nem menos sabe o que significa pudor
(apenas vontade)

(O prazer e o carinho simplesmente perfuram todos os egos
As poses
As mágoas)

Queria provar-lhe o gosto...
Bem sabemos ambos
Que essa nova roupagem puramente cinzenta,
Esse cenho ainda mais franzido(no),
São consequências da pulsação lenta,
Mas que de tão intensa,
Não estanca;

Enganam-se os olhos que julgam
Não ter cor o homem sério
Ele sangra!
E se quisesse era capaz de tornar
o mundo inteiro vermelho.

Mas olhar tão denso como o teu
Ao primeiro toque congelaria frágeis asinhas de açúcar
Tão coloridas, miudinhas
Compostas de sonho e ilusão.

Tanta melancolia verdadeira
Pesaria tão feio as asas
Que me tornaria um barata.

Confesso com 32 dentes
Queria desarmar-lhe com beijos!
Tornar-lhe pluma com infantilidades

Quem dera amolecer cada instante de teu corpo
Com qualquer canção tola ao acaso
Tornar-te bobo!
Fazer-nos risonhos!

Temes tanto o ridículo quanto a vida?

Queria beijar-te cada parte rígida
Até desatar-te em gargalhadas infindáveis


Eras uma criança tão bonita...

3 comentários:

  1. Eras uma criança tão bonita...
    Que diabos aconteceu? Agora era magro, pálido, de barba e cabelo desgrenhados, sono por dormir, fome por saciar. Revirava seu olho ao observar meus cabelos. Meu nariz, boca, seios, pernas. Esquadrinhava-me com os olhos famintos de quem sofre mas revida. Senti medo. Eras uma criança tao bonita, tentei dizer-lhe, sem nada sair de minha boca seca. Ele babava saliva amarela que escorria pela barba suja. Senti nojo. Eras uma criança tão bonita..., pensei, com pesar. Os olhos antes de um castanho amendoado, brilhante que refletia a vida, agora vazios e profundos como cu de travesti. Cruzes, que analogia terrível! Não sabia na ocasião que ele era familiarizado com os comparados. Senti repulsa. "Eras uma criança tão bonita", disse então, enfim cuspindo as palavras da garganta. Levantou a sobrancelha amarelada, cuspiu duas vezes no chão e disse-me, a voz rouca de cigarro e maus tratos: "Foda-se", emendando com a terceira cuspida. "Pois bem", tratei de seguir meu caminho.

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  2. absurdamente relacionavel com o texto! ->[ironia]<-

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