segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Todo terra

Parecia que falávamos línguas distintas. Você, absorto em toda a segurança de sua vida; tranquilo na maturidade de suas conquistas. Cada palavra que você fazia soar tinha tanta exatidão e ecoava tão objetivamente que era como se todo o som que saía da sua sua boca se reverberasse já como verdade, e não como perspectiva. Me limitava a rir de medo. Eu, um poço de inseguranças e indecisões, de receios e hesitações, era uma folha em branco que a cada segundo especulava com muita gagueira o jogral de cores a ser impresso definitivamente em mim mesmo. Enquanto isso, eu tinha um comportamento extravagante e fútil, mas adorável e ingênuo, daqueles que só cabem a jovens medrosos. O soar dos meus questionamentos bobos aos seus olhos se perdiam na sua estrutura sólida; você parecia todo terra, todo segurança. Eu quase não te via poesia e tinha um medo profundo e risível de ser ridícula, porque por mais que eu não te achasse ideal, era o que eu almejava. Eu me projetava no que você era, como um irmão mais novo se vê no mais velho. Esse seu ser tão adulto, certo de si. Eu queria ser assim, me estabelecer de alguma forma. Nem que fosse emocionalmente. Nem que eu não fosse tão estabelecida, nem que fosse só a imagem de pessoa segura. Eu não sabia aonde, eu não sabia o por que, eu não sabia como, eu não sabia quem eu era, eu não sabia o que eu era, não sabia o que eu queria ser, não sabia o que eu tinha almoçado, mas eu queria ser independente e arranjar um caminho para todas essas coisas. Eu não queria as respostas e achava um pouco amarga toda essa sua seriedade. Era tudo tão certo. Tão adulto. Acho que a juventude se caracteriza por essa dúvida latente rasgada no peito. E é provável que você a tivesse, mas a escondesse muito bem e não deixava que ela controlasse sua vida. Todos os adultos, quero dizer, pessoas que agem como adultos, são atravessados por dúvidas agonizantes. Mas o que as torna adultas são a capacidade de tomar as rédeas da situação, escondê-las e conduzir a vida como quem já se esqueceu.