Com um gelo ácido
Com um áspero friamente calculado
Limitou meu calor, a sua razão.
Cobriu de cal as brechas
Tampou de cimento os ouvidos
Os olhos, a boca, as narinas
O meu sexo.
Só poupou a pele que ficou sentindo as ranhuras do teu discernimento
Só poupou o tato pra sentir a sua temperatura ártica
Sentir o teu peso morto que vai arrastando
Vai arrastando pesado
Até eu parar na cama imóvel.
A cama o tato o frio o peso e eu parada.
A dor cortando por dentro e por fora é imóvel.
Meu corpo pesado e eu parada.
Só as lágrimas revelam a delicada dinâmica do âmago
domingo, 16 de outubro de 2016
quarta-feira, 13 de julho de 2016
Manhã
Nenhuma elocubração
Pessimista e egocêntrica
É tão importante que o crepúsculo não possa desfazer.
As decisões intransponíveis que você tomou durante toda a vida
Aquela perspectiva que você não sugeriu no projeto em conjunto
A resposta mal criada que te evitaria a dor de garganta sintomática
E todos os instantes auto depreciativos que você se apega no seu quarto
No momento preciso
(sagrado ou maldito)
da madrugada individual
Se desfazem com o som ensoso
da resignação matinal.
Há uma frieza ingênua,
uma canção irrefletida
Que ecoa pelo trabalho que começa logo cedo.
O trabalho dos olhos, dos pés
do esquecimento
Rasga e passa como um trator
Sobre a segurança introspectiva do breu das 4 da manhã.
O auto júri que levantamos
Que nos aponta dedos e fracassos
No escuro do nosso ventre egoico
É desmantelado pelo nascimento cotidiano
Da força coletiva matutina.
O mundo intocável
do desejo e das frustrações
Dá lugar ao ofício.
Já os sonhos...
Esses há muito não tem espaço
Na corrida em que competem
O dia e a noite.
domingo, 10 de abril de 2016
flor pisada
O seu ruído é uma rosa
arrastada pelo asfalto
Esse seu
carinho negligente
é a margarida esquecida no meio fio
E essa falta de ritmo
essa nossa falta de fôlego
(falta de olho)
é um girassol comido
todo
por uma sola de sapato
todo
por uma sola de sapato
(ou por mil pés muito calçados numa tarde de carnaval)
Essa sua indiferença
meu estranhamento
Por fim: todo esse drama que me é de direito
não passa de um crisântemo triste
já morto
(mesmo que ainda lindo)
mastigado pelos meus dentes
sôfregos e selvagens
(Ah, eu me sinto impotente e orgulhosa
como as rosas podres
ignoradas pelo florista.)
terça-feira, 29 de março de 2016
De olhos fechados
O meu bem desliga as luzes
Me libera no escuro
E me liberta na ignorância
Da não identificação visual.
Eu tenho medo
De deixar de lado meus conceitos
Mas meu bem quer
que a experiência de uma nova perspectiva,
O tato,
Me guie na produção de novos conhecimentos.
Lá se vão imagens conhecidas
Para que texturas e novas formas sejam descobertas
Naquele instante em que as conheço
E as conecto.
É que meu bem anda sempre de olhos fechados
Como se não conhecesse nada ou ninguém
Para ele, qualquer contato é o primeiro
E tudo é sempre novo
E possibilidade de ser outro.
Me libera no escuro
E me liberta na ignorância
Da não identificação visual.
Eu tenho medo
De deixar de lado meus conceitos
Mas meu bem quer
que a experiência de uma nova perspectiva,
O tato,
Me guie na produção de novos conhecimentos.
Lá se vão imagens conhecidas
Para que texturas e novas formas sejam descobertas
Naquele instante em que as conheço
E as conecto.
É que meu bem anda sempre de olhos fechados
Como se não conhecesse nada ou ninguém
Para ele, qualquer contato é o primeiro
E tudo é sempre novo
E possibilidade de ser outro.
domingo, 20 de março de 2016
Amorfo
Tu:
O mar que lambe minhas pernas à noite
escuro, denso e infinito.
Em ti há o prazer de (saber o) existir
e o receio de se perder (em ti).
Para aquele sobre o qual eu não consegui escrever.
O mar que lambe minhas pernas à noite
escuro, denso e infinito.
Em ti há o prazer de (saber o) existir
e o receio de se perder (em ti).
Para aquele sobre o qual eu não consegui escrever.
segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016
Poesia Sincera
Eu vejo você surgir
brilhante dessa chuva
A pele pegajosa de
água divina e suor
transpirando cansaço
Vejo você emergir de
baixo
Uma camiseta comum e
uma bermuda comum
Roupas típicas de
calor de um dia quente comum
Eu vejo você surgir
entre as luzes artificiais
Filtradas pelas janelas
molhadas do 434
e fragmentadas
pelos pingos aleatórios e inconvenientes
pelos pingos aleatórios e inconvenientes
da chuva
(que tanto
esperávamos
Mas que detestamos
Em uma segunda feira
à noite)
E que estão por todo
lugar
importunando a vida
Daquelas pessoas
cansadas
Eu vejo você subir
um pouco ofegante
Um pouco afoito
Os óculos um pouco
baixos
(Como que caíram
pela pressa)
O cenho um pouco,
mas muito pouco, franzido
(Como quem tem que
prestar atenção em muitas coisas)
As lentes, que mais
te impedem de enxergar,
Deviam formar um
caleidoscópio das cores noturnas urbanas
Pela mescla da
sujeira e das gotículas de chuva
(Ah,
I-ne-vi-táveis!)
Que você tanto odeia
Mas eu vejo calmo o
seu semblante
Sempre calmo e claro
Surgir no final do
meu dia
Em meio àquele calor
De 29 de
fevereiro
(De ano bissexto)
Você segura no cano
amarelo e sujo
Do ônibus sujo e
quente
(pro qual o Eduardo
Paes ainda não providenciou ar-condicionado)
Pra não sair voando
Com a arrancada do
motorista
Eu vejo você tomar
fôlego
E conquistar a calma
de conseguir a vitória de pegar um ônibus
Em um dia chuvoso de
uma cidade mal planejada
E era tudo o que eu
queria
A sua aparição
naquele maldito 434
Sujo e quente
Nas 19 horas de uma
segunda-feira
De um Rio de
Janeiro que agora era um rio imundo e
cinza
Causado pelas chuvas
torrenciais
de um verão póstumo
É fútil, diante da
vida daquelas pessoas,
Mas eis minha
confissão:
Eu só queria
presenciar sua reação
Ao me ver ali
sentada e suada
Contemplando a sua
chegada
(Eu só queria ver o
papo aranha que você ia inventar
Já que foi você o
cretino
Que me deu um pé na
bunda)
Mas com aquela
arrancada do motorista
O ônibus voltou a
andar
Passamos, eu e ele
(E todas as pessoas
cansadas e desconhecidas)
O seu ponto
Passamos a sua rua
Passamos a
possibilidade de te encontrar acidentalmente
E, bem...
O que mais eu posso
escrever agora?
Vou ter que esperar
a próxima volta para casa
(ou o próximo amor
não correspondido
Que more perto das
redondezas)
No 434
Assinar:
Postagens (Atom)